sábado, 1 de junho de 2013

GITA

No finalzinho da década de 1970, dividi com um locutor de radio, do qual não me lembro mais o nome, a animação do sistema de som das Quermesses da Comunidade de Santa Luzia no JD. Vista Alegre em Limeira. A igreja ainda estava em construção, no alicerce. As festas eram realizadas, em cima da laje onde se construiria mais tarde o templo. Ficávamos em uma barraca, com uma iluminação bem fraquinha, uma mesa de som antiguíssima e um único microfone. Era o tempo do Vinil. Os membros da comunidade contribuíam, emprestando os bolachões. Eu mesmo levava os meus, que quase nunca eram tocados. Atendíamos pedidos e o que se tocava, eram musicas dos Bregas da época, meus discos eram considerados “cabeça” demais para o povão.

Mas entre os Lps, muitos deles riscados e quase sem condições de uso, estava os de Raul Seixas. O Maluco Beleza eram um dos mais tocados. Não vencíamos os pedidos para executar os mega sucessos do cara. Eu não prestava muito á atenção em Raul. Vi nele muito comercialismo, e pouco engajamento social. Eram os tempos das manifestações públicas contra a ditadura, tempos da Teologia da Libertação e eu já andava com Marx e Leonardo Boff debaixo do Braço.

Fui me ater á Raul um pouco mais tarde, quando estudei sua obra. Raul Seixas, tinha na mística, sua oração de vida. Suas canções não se furtavam a reclamar da condição da juventude, naqueles duros anos 70. Conseguia Raulzito unir, a ideia da transcendência, como um modo de vida alternativo. Foi esta concepção que o fez desagradar os militares. Com base na filosofia do ocultista Britânico  Aleister Crowley, que Raul Seixas criou a Sociedade Alternativa. Algo que o próprio Raul não sabia explicar o que seria de fato. A Sociedade lhe custou um exílio forçado ao Estados Unidos em 1974. Os militares não estavam gostando nada da coisa de uma cidade das Estrelas. Nome que Raul e Paulo Coelho dariam á Sociedade Alternativa e seria em Minas Geraes.

Ao retornar do Exílio  Raul e Paulo, vieram cheios de projetos, entre eles o novo disco. Aí surgiu, Gita, no final de 74. Este disco será definitivamente o boom da carreira do cantor e compositor. O mais vendido, com mais de 600mil cópias, tocou em todas rádios e programas de Televisão. A capa um primor. Raul Seixas de boina vermelha e guitarra em punho, em uma representação de um guerrilheiro em luta contra o regime. O LP é um desfile de Hits de Raul: Medo da Chuva, Trem das sete, Sociedade Alternativa e claro Gita.

Sem dúvida Gita é o maior e talvez uma das melhores letras do cara. Nós dos tempos das Quermesses, achávamos que Raul Seixas falava de Deus. De certa forma sim. Ela  é baseada no Bhagavad-Gitã, parte do Mahabarata, que seria a "bíblia" da religião hindu de Krishna. Um guerreiro hindu questiona quem seria o Krishna, o Deus da Religião Oriental.

Raul Seixas, mesmo após a sua morte atravessa como ídolo de antigas e novas gerações. Seus discos continuam a vender. Artistas Roqueiros em especial, continuam se influenciando por sua obra, seu estilo de juntar Luís Gonzaga com Elvis Presley. A mania dos Covers começou com os de Raul. Em vários eventos musicais, se ouve constantemente o Toca Raullllllllll.

Nós também vamos pedir um Toca Raul. Veja e ouça Gitã aqui: http://migre.me/ePdNh .

Gita
- Eu que já andei pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho que Ele me falou:
Às vezes você me pergunta
Por que é que eu sou tão calado,
Não falo de amor quase nada,
Nem fico sorrindo ao teu lado.
Você pensa em mim toda hora.
Me come, me cospe, me deixa.
Talvez você não entenda,
Mas hoje eu vou lhe mostrar.
Eu sou a luz das estrelas;
Eu sou a cor do luar;
Eu sou as coisas da vida;
Eu sou o medo de amar.
Eu sou o medo do fraco;
A força da imaginação;
O blefe do jogador;
Eu sou!... Eu fui!... Eu vou!...
Gita! Gita! Gita!
Gita! Gita!
Eu sou o seu sacrifício;
A placa de contra-mão;
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição.
Eu sou a vela que acende;
Eu sou a luz que se apaga;
Eu sou a beira do abismo;
Eu sou o tudo e o nada.
Por que você me pergunta?
Perguntas não vão lhe mostrar
Que eu sou feito da terra,
Do fogo, da água e do ar!
Você me tem todo dia,
Mas não sabe se é bom ou ruim.
Mas saiba que eu estou em você,
Mas você não está em mim.
Das telhas eu sou o telhado;
A pesca do pescador;
A letra "A" tem meu nome;
Dos sonhos eu sou o amor.
Eu sou a dona de casa
Nos pegue pagues do mundo;
Eu sou a mão do carrasco;
Sou raso, largo, profundo.
Gita! Gita! Gita!
Gita! Gita!
Eu sou a mosca da sopa
E o dente do tubarão;
Eu sou os olhos do cego
E a cegueira da visão.
Eu!
Mas eu sou o amargo da língua,
A mãe, o pai e o avô;
O filho que ainda não veio;
O início, o fim e o meio.
O início, o fim e o meio.
Eu sou o início,
O fim e o meio.
Eu sou o início
O fim e o meio.




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