sexta-feira, 29 de maio de 2009

SÉRIE: A MÚSICA INSPIRA UM CONTO- I



ROSALIA

Foi o dia mais feliz de minha adolescência. Não esqueço jamais. Se um dia for escrever um livro de memórias, sem duvida este fato será tido como o mais importante, não para minha formação de caráter, mas para o conhecimento do afeto e do carinho. Naqueles tempos, as casas de mulheres, de divertimentos masculinos ou zona do meretrício, eram raras nas cidades, no máximo uma. A curiosidade em conhecer estas sedes do prazer dos homens, se disseminava entre os garotos de minha idade, a maioria se descobrindo para o sexo. A punheta, era o máximo que muitos entre nós chegou de uma relação. Claro que os famosos trocas-trocas existiam, mas ninguém em sã consciência admitia esta experiência. Todos se diziam machos e contavam historias de aventuras com mulheres, as quais era difícil de provar. A vontade mesmo, estava em conhecer a Casa de dona Concha, cujo apelido era em função de suas curvas um pouco gordurosas.

O acesso a casa, era difícil. Primeiro pelo fato de que menor de idade não podia freqüentar o estabelecimento, só acompanhado pelo Pai e mesmo assim depois de muita negociação com a gerente do negocio. Segundo, que o imóvel, ficava bem distante da cidade, onde poucos entre nós conhecíamos o caminho para lá chegar. Terceiro e principal motivo, era muito caro, passar uma hora com as deusas que fantasiávamos após o futebol no campinho.

Um dia Joaquim Barriga D’Água, era chamado assim, porque se falava que teve esquistossomose quando tinha sete anos, chegou e disse que devíamos invadir a casa de Dona Concha. Ele não aquentava mais de ansiedade, dizia- Não que eu precise, vocês sabem, eu tenho garotas a hora que quiser, mas é pra prestar um favor, aos amigos que só transam com eles mesmos-, o pau comeu, todos demos uns petelecos no barrigudo. Mas resolvemos leva-lo a sério. Mas você sabe onde fica a casa? Perguntou o Titão- Sei meu irmão que lá esteve me disse-. Bom se é assim, então podemos ir, dissemos em coro. Mas aí Dario, levantou outras questões. Como vamos entrar? E com que dinheiro, vamos transar?. Joaquim esperto como um touro disse- Pois é, não sei-. A vontade era de socar o cara. Mas aí, não me lembro, quem falou- È de dia, elas com certeza não trabalham esta hora, podemos pedir pra ouvir musica, soube que lá havia uma Juke Box. Este seria o álibi, ou desculpas.

Muito bem marcamos, para o dia seguinte nossa saída para a Casa de nossos sonhos, depois da escola e após o almoço, tipo uma da tarde, no campinho mesmo. Fizemos o pacto de que apenas os que ali estavam iriam para a aventura. Era o pacto da tramela fechada. Que foi o primeiro a cair. Ao chegar no local combinado, praticamente todo o time de futebol do bairro, esta ali, até os garotos mais novos. Depois de muito bate boca, para descobrir quem foi o linguarudo, a Candinha da turma. Decidimos que apenas os menores de 13 não iriam. Eles chiaram e se foram para as casas. Pelo menos achamos que tinham ido para casa.

Lá fomos então, mais ou menos uns quinze, todos excitados, a ponto até de cantar os próprios companheiros de viagem. O Barriga D’Água a frente da expedição, pois era o único que dizia que sabia onde estava a casa. Levamos quase 2horas para encontrar. O panaca, se perdeu, disse que tinha esquecido o caminho que o irmão tinha lhe explicado.

A fachada da casa, era dos tempos coloniais. Parecia ser muito grande. Logo na entrada, uma escada com uns dez degraus e uma porta enorme. A ansiedade era grande, mas naquele momento bateu um medo, ninguém queria bater na porta e pedir para ouvir musica. Depois de muita hesitação e conversação, Ulisses por ser o mais velho e metido a comedor, foi o escolhido. Subiu os degraus, quase que em câmera lenta. Tremia feito vara verde. Aí ao chegar defronte a porta, quis voltar, mas escutou, um nem pensar seu porra. Bateu na porta e imediatamente aconteceu o que não imaginávamos. Não só a porta principal se abriu, como as janelas laterais e portas do fundo, é como se as moradoras da casa estivessem nos esperando. No fundo de cada um de nós, quando uma senhora gorda, simpática e com um rosto muito bonito, disse: Hum visitas, que bom, minhas meninas precisam de companhia durante o dia, distraí- achávamos que a virgindade iria para o espaço naquele dia.

Entramos, um grande salão e uma enorme escada que com certeza, era o caminho para os quartos. Nenhum de nós, se cabia de felicidade e de timidez. Aos poucos a sala foi invadida pelas mulheres mais lindas que já tinha visto na vida. Alguém ligou a Juke Box, igualzinho aqui tínhamos visto no catecismo do Zéfiro. As musicas eram diversas, tinha Roberto, Odair José, Waldick Soriano, Paulo Sergio e até Rock In Rool. Aos poucos todos foram perdendo o medo e a vergonha e o local transformou-se em um verdadeiro baile. As garotas muito boas de papo. Sexo? Você devem estar se perguntando. Apesar de não esquecermos do propósito ao qual nos levou até aquele estabelecimento, ninguém ousou avançar sinal.

Eu conheci Rosalia, seu nome de guerra era Marina. Ela me chamou para seu quarto, um local limpo, com uma decoração moderna e com um cartaz imenso de Janis Joplin. A menina de 20anos era fã da Roqueira. Conversamos muito, ela dizia de seus sonhos, de estudar e ser médica veterinária e depois quem sabe casar. Gostava daquela vida, entrou ali, porque o pai e expulsou de casa, quando a pegou na cama com o namorado, sem antes constranger a menina, ao fazer os irmãos verificarem eles mesmos a virgindade da garota. Mas apesar de se sentir amada pela Dona Concha, seu desejo era sair um dia dali.

Trocamos um beijo, (o primeiro de minha vida), mais afetuoso do que excitante. Disse a ela que gostaria de um encontro longe dali, um sorvete, após um filme no Cine Vitória. Ela disse que não podia, as pessoas da cidade não entendiam aquela vida e não queria me prejudicar, quem sabe um dia.

Fomos embora as cinco da tarde, felizes pelas horas ali passadas. Ninguém transou. Este seria nosso segredo. Mas a fama de que fomos os únicos a adentrar o palácio das Mulheres de Dona Concha, se espalhou rapidamente pelo bairro.

Eu, bem não consegui esquecer de Rosalia. Seu sonho de um dia sair dali, se transformou o meu por um tempo. Depois, a vida continuou e nunca mais vi a garota ou voltei a casa de diversões, que anos depois foi fechada pelas autoridades locais para abrigar condomínios de luxo.

A Música que inspirou o conto:

Vou Tirar Você Deste Lugar
Odair José

Composição: Odair José

Olha... A primeira vez que eu estive aqui

Foi só pra me distrair

Eu vim em busca do amor Olha..

Foi então que eu te conheci

Naquela noite fria

Em seus braços meus problemas esqueci Olha...

A segunda vez que eu estive aqui

Já não foi pra distrair

Eu senti saudade de você Olha...

Eu precisei do seu carinho

Pois eu me sentia tão sozinho

Já não podia mais lhe esquecer


Eu vou tirar você desse lugar

Eu vou levar você pra ficar comigo

E não interessa

O que os outros vão pensar

Eu vou tirar você desse lugar

Eu vou levar você pra ficar comigo

E não interessa

O que os outros vão pensar


Eu sei... Que você tem medo de não dar certo

Pensa que o passado vai estar sempre perto

E que um dia eu posso me arrepender

Eu quero

Que você não pense nada triste

Pois quando o amor existe

Não existe tempo pra sofrer


Eu vou tirar você desse lugar

Eu vou levar você pra ficar comigo

E não interessa

O que os outros vão pensar

Eu vou tirar você desse lugar

Eu vou levar você pra ficar comigo

E não interessa

O que os outros vão pensar

Eu vou tirar você desse lugar