quinta-feira, 30 de maio de 2013

SONHO IMPOSSIVEL

Caetano Veloso em seu livro auto biográfico, Verdade Tropical de 1997, trabalha em vários capítulos seu amor e admiração por sua irmã, Maria Bethânia. Mais nova que ele, foi Caetano que a incentivou a cantar. Foi o próprio que a estimulou a descobrir no teatro, as performances dramáticas que a cantora vai adotar em seus Shows. Que alias como diz o artista e Vereador de Limeira, José Farid Zaine são verdadeiros espetáculos de poesia.

A primeira incursão de Bethânia, foi exatamente nas artes cênicas. Na Bahia já tinha participado em vários espetáculos, emprestando sua voz, para textos como Boca de Ouro de Nelson Rodrigues. Mas vai ser no Show Manifesto Opinião, no Rio de Janeiro, que a irmã de Caetano vai se apresentar para o Brasil. Substituindo Nara Leão, que se afastou por motivos de saúde, Bethânia se junta ao cantor do nordeste João do Vale e ao sambista dos morros cariocas e canta em 1965, “Carcará pega, mata e come”.

A capacidade da cantora, em interpretar canções, com fortes elementos teatrais é algo que atinge a alma, faz todos os sentidos humanos virem a tona. Não tive ainda o privilégio de ver ao vivo, Maria Bethânia. Invejo o mesmo Farid, por ter não só assistido a um Show, mas a de ter feito uma canção “Mulher que Canta”, que esta no CD do Grupo Avena “Línguas”. Bethânia também fez parte de meu imaginário juvenil. A ouvia muito nas rádios nos anos 70, principalmente na radio Tupi do Rio.

Sonho Impossível, esta no disco “Chico Buarque & Bethânia ao Vivo”. O LP é resultado do Show de 1975 em temporada na famosa casa de espetáculos do Canecão do Rio de Janeiro. Show inclusive de enorme sucesso. Maria Bethânia se junto a Chico, outro amante do Teatro que já tinha uma relação estreita com o palco, escrevendo não só canções, mas Histórias, como Calabar, Gota d’agua e outras.

A canção fez parte da trilha de “O Homem de la Mancha”, uma versão de peça da Broadway de 1966, em parceria com Ruy Guerra. Foi a primeira de Chico fazendo versões. O espetáculo é de 1972, mas só gravado no Show com Bethânia. Eram os tempos de Ditadura, censura prévia, torturas, amigos sumindo, depoimentos no Dops, e gente indo direto para o Galeão. O ritmo uma balada, a letra uma primazia, que parece coisa de Dom Quixote, Utopia ou Sonho mesmo. A letra exatamente uma leitura fiel daqueles tempos, que a esperança parecia ser impossível.

Em 2010, escrevi um esquete para homenagear o Professor e amigo Joaquim Lazari, no qual incluí esta canção no encerramento do espetáculo.
Abaixo a letra magnifica de chico e o link com a interpretação de Bethânia: http://migre.me/eNsBW .


Sonho Impossível

Chico Buarque

Sonhar
Mais um sonho impossível
Lutar
Quando é fácil ceder
Vencer
O inimigo invencível
Negar
Quando a regra é vender
Sofrer
A tortura implacável
Romper
A incabível prisão
Voar
Num limite improvável
Tocar
O inacessível chão
É minha lei, é minha questão
Virar esse mundo
Cravar esse chão
Não me importa saber
Se é terrível demais
Quantas guerras terei que vencer
Por um pouco de paz
E amanhã, se esse chão que eu beijei
For meu leito e perdão
Vou saber que valeu delirar
E morrer de paixão
E assim, seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão

          

terça-feira, 28 de maio de 2013

MARIA, MARIA

Nos inicio dos Anos 80, participei com cantor de uma Banda intitulada GLAVDES. A sigla era o nome de cada integrante do grupo, todos da Pastoral da Juventude da Igreja de Santa Luzia, em Limeira. O G de Geraldo meu segundo nome, LA de Laurita, a mais nova do grupo, V de Vicente, o mais velho e único músico para valer, D de Dario e de Donizete, o primeiro no Triangulo, o segundo no Vocal, E, de Edson e S de Solange. Eram dois violões, um atabaque e um triangulo. Mesmos instrumentos que usávamos para o coral da comunidade. Formamos a Banda para tocar MPB, o ritmo que adorávamos, eu tão a muito tempo.

O GLAVDES até que teve vida longa, uns três anos. Show mesmo uns dois, entre eles na Quermesse da comunidade. Mas o que realmente impactou, foi nossa apresentação em 1981, no evento organizado pela Pastoral da Juventude da Diocese, que a cada dia uma comunidade apresentava um numero cultural. Lotou o ginásio Vô Lucatto, muitos Jovens, amigos, parentes, dançaram e cantaram nosso repertório. Não havia canção comercial ou romântica. Era os tempos de canções com mensagens políticas ou de raízes, como baião. Maria, Maria estava no check List.

Boa parte do repertório, talvez todo ele, fui eu quem escolheu. Esta era uma de minhas favoritas. Cantávamos esta musica nas missas da comunidade, nas festinhas da juventude, no meio fio das calçadas. Identificávamos, sua letra a mãe de Jesus Cristo, mas também, a todas as mulheres pobres deste País. Cantávamos a todo pulmão. A letra é muito forte. Trata-se de uma homenagem do Bituca (apelido de Milton), a sua mãe biológica, que ao sentir que não tinha condições de cria-lo em função da miséria, o deixou com seus patrões (ela era empregada doméstica), do Rio de Janeiro, que o adota-lo.

Maria, Maria, é um hino ás mulheres que na vida são verdadeiras guerreiras heroínas de suas famílias. Lutando contra as adversidades da vida, as Marias de Milton Nascimento, o fazem com raça, garra e graça. Conheci tantas e conheço varias destas mulheres, que para proteger os seus, não se esmorece, enfrenta todas as dificuldades com esperança. São Mulheres anônimas, que não fazem questão alguma de status, brilho ou prêmio. Fazem da luta, sua profissão de fé.

Maria, Maria, foi gravada pela primeira vez no disco Manifesto Clube da Esquina 2, um álbum duplo com a participação da turma de Minas e de convidados, como Elis Regina e Chico Buarque. O LP é de 1978, mas a música foi feita para o Espetáculo do mesmo nome, o primeiro do Grupo Corpo em 1976. As músicas do espetáculo, juntamente com o ultimo trem, foi lançado em CD apenas em 2004.

Maria, Maria, obteve varias regravações inclusive Internacionais, como Mercedes Sosa e Sarah Vaughan. Clic aqui e veja e ouça o autor cantando esta pérola. http://migre.me/eLBz6 .

Maria, Maria
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta…
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que rir
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta…
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria…
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida….
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria…
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida….
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah!
Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!…
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria…
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida….
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah!
Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!…


  

domingo, 26 de maio de 2013

EU SOU APENAS UM RAPAZ LATINO AMERICANO

Sempre gostei de ir em bancas de Jornal, para garimpar publicações de musica, livros e cultura em geral. A banca IV Centenário, ao lado do relógio da praça Toledo de Barros, em Limeira, é minha favorita. Seu chico o dono da banca, me chamava pelo nome. Hoje quase não apareço por lá, mas repito o ritual de passar os olhos ou folhear revistas sobre o assunto na Banca de meu bairro. Foi em uma destas passagens pela IV Centenário, em 1976, que tive contato com a Revista Violão & Guitarra.

A publicação, trazia canções cifradas para os instrumentos que davam titulo a revista. Ela é um clássico do gênero. Conheço muita gente, músicos de qualidade que aprenderam a tocar musica através das notas musicais do periódico. Não me lembro, se era mensal ou semanal o numero da revista. Meu interesse era em primeiro lugar, conhecer letra de musicas que ouvia nas rádios e segundo um desejo de aprender a tocar violão. Uma das maiores preguiças de minha vida, é aprender a tocar. Não tenho paciência para sala de aula. Por fim, estes eram motivos.

Não tínhamos grana para comprar discos, e pouco que ganhava de meu pai, gostava de comprar as revistas. Um dos números trazia Belchior na capa, com casaco de peles, sorrindo e um boné na cabeça. O bigodão estava lá, com suas canções e uma delas era Eu Sou apenas um Rapaz Latino Americano. Belchior como compositor já era consagrado. Elis Regina e Vanusa já o tinha gravado e feito sucesso com suas canções: Como Nossos Pais, Velha Roupa Colorida, Elis e Paralelas com a Vanusa.

Mas foi Eu Sou Apenas um Rapaz, responsável para que o Brasil, conhece-se não só o brilhante compositor, mas o cantor. Voz grossa e grave, Belchior emplacou a canção nos Top 10, 05 e 01, das paradas de sucesso. Me lembro que antes de ir para a escola, estudava no Trajano Camargo naquele ano de 1976, na sexta serie, passei na banca e comprei o numero da Revista. Ao sair da escola, chovia muito e ao chegar no ponto de ônibus, onde hoje é a agencia da caixa econômica federal da Praça Toledo de Barros, não aguentei, tirei a revista da mochila e mesmo debaixo de chuva, fui direto ler a letra de Eu sou Apenas.

A letra é mais uma que coloca as angustias de um autor com seu cotidiano, de ditadura, de um povo pobre e de um país amordaçado. Já disse que Belchior é um compositor que melhor relata o intimo do Latino Americano. Na canção ele contesta Caetano Veloso e Gil, por conta da Música Tudo é Divino Tudo é Maravilhoso. Apesar da letra dos baianos, apresentarem o espirito da juventude da época, de protestar contra os desmandos do regime e ao mesmo tempo fazerem a ode ao estilo Hippie e psicodélico, Belchior naqueles anos 70, discorda de que tudo era maravilhoso.

Em 2010 me juntei ao Professor e Músico Claudio Corrêa e criamos o projeto A Palo Seco, uma banda para tocar canções de Belchior e com composições próprias trabalhar seu estilo. Tivemos vida curta, um Show e um Festival. Mas um dia a gente retoma o projeto, pois as novas gerações precisam conhecer este fantástico artista, da alma das Américas. Eu Sou Apenas Um Rapaz Latino Americano, esta no disco Alucinação de 1976.

Eu sou apenas um rapaz latino americano

Eu sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco
Sem parentes importantes e vindo do interior

Mas trago na cabeça uma canção do rádio
Em que um antigo compositor baiano me dizia
Tudo é divino, tudo é maravilhoso

Tenho ouvido muitos discos, conversando com pessoas
Caminhado o meu caminho, papo o som dentro da noite
E não tenho um amigo sequer que ainda acredite nisso não
Tudo muda, e com toda a razão

Eu sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco
Sem parentes importantes e vindo do interior

Mas sei que tudo é proibido, aliás, eu queria dizer que tudo é permitido
Até beijar você no escuro do cinema quando ninguém nos vê

Não me peça que eu lhe faça uma canção como se deve
Correta, branca, suave, muito limpa, muito leve
Som, palavras são navalhas e eu não posso cantar como convém
Sem querer ferir ninguém

Mas não se preocupe, meu amigo com os horrores que eu lhe digo
Isso é somente uma canção
A vida realmente é diferente quer dizer, ao vivo é muito pior

Eu sou apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco
Por favor não saque a arma no saloon, eu sou apenas um cantor

Mas se depois de cantar você ainda quiser me atirar
Mate-me logo à tarde, às três que à noite eu tenho compromisso
E não posso faltar por causa de você

Eu sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco
Sem parentes importantes e vindo do interior

Mas sei, sei que nada é divino
Nada, nada é maravilhoso
Nada, nada é secreto

Nada, nada é misterioso não

quinta-feira, 23 de maio de 2013

OVELHA NEGRA


OVELHA NEGRA
A Revista Intervalo, que tinha um formato muito próximo do de bolso, colorida na capa e no miolo, foi para mim como já afirmei nesta serie uma fonte de conhecimentos de musica Brasileira. Folheando um dos números no inicio dos anos 70, vi a foto de uma loirinha vestida com uma túnica estilo noviça rebelde e segurando uma flor. Era Rita Lee, então vocalista da maior banda de Rock do Brasil de todos os tempos, os Mutantes.

Fiquei interessado e fui a busca de informações dela e do grupo. Totalmente influenciados pelo Rock Psicodélico, os irmãos Dias e Rita fizeram História no Rock e na MPB. Recentemente assisti o documentário “Uma Noite em 67”, sobre o famoso Festival da Virada. Os Mutantes, junto com Gilberto Gil apresentaram ao mundo a possibilidade de fundir guitarras elétricas ao Berimbau e a uma orquestra sinfônica. Nascia a Tropicália de Gil que neste Festival acompanhado dos Mutantes cantava Domingo no Parque e Caetano Veloso.

Os Mutantes eram pura experimentação. Da Tropicália para a psicodélia, depois para o Rock Sinfônico. Rita parecia nos meados dos setenta, voos solos, formulas mais simples de musica, até um pouco comercial e compor mais. Ela deixa os Mutantes e envereda para a carreira individual. Faz três discos antes de Fruto Proibido. Conquista espaço nas Rádios e programas de auditório e populares na TV. Emplaca alguns sucessos como José e Menino Bonito.  

Mas o estouro vem mesmo com Fruto Proibido, o segundo com a Banda Tutti Fruti. A Banda que tinha em Luis Sergio Carlini, seu líder, começou em 1971, como Coqueiro Verde. Tocando em bares do Bairro de Pompéia e na onda das drogas lisérgicas da época, o grupo muda para Lisergia. Ao conhecer Rita, a loirinha não gostava do nome da Banda que passa a ser de apoio da Cantora. O nome do Show de 1974, é que vai se encaixar na nominação da Banda.

Vai ser Ovelha Negra, o grande sucesso deste disco, que terá ainda os clássicos, Agora Só Falta Você de Rita com Carlini e uma das três na parceria com o bruxo Paulo Coelho Esse Tal de Roque EnrowOs arranjos são de Carlini e quase todo Blues Rock. Rita assina quase todas as canções, e Ovelha é uma das que ela fez sozinha para o disco.

O conteúdo, o que vai marcar a carreira de Rita Lee, o cotidiano de cada tempo vivido por ela. O conflito familiar da menina rebelde, é a tônica de Ovelha Negra. A cantava no meio fio das calçadas com os amigos e nas festinhas onde rolava MPB. A Música foi ainda tema da segunda versão de Mulheres de Areia na TV Globo. Link para o vídeo da canção: http://migre.me/eH6Qm .
Ovelha negra
Levava uma vida sossegada
Gostava de sombra
E água fresca
Meu Deus!
Quanto tempo eu passei
Sem saber!
Uh! Uh!...
Foi quando meu pai
Me disse:
"Filha, você é a Ovelha Negra
Da família"
Agora é hora de você assumir
Uh! Uh! E sumir!...
Baby Baby
Não adianta chamar
Quando alguém está perdido
Procurando se encontrar
Baby Baby
Não vale a pena esperar
Oh! Não!
Tire isso da cabeça
Ponha o resto no lugar
Ah! Ah! Ah! Ah!
Tchu! Tchu! Tchu! Tchu!
Não!
Oh! Oh! Ah!
Tchu! Tchu! Ah! Ah!...
Levava uma vida sossegada
Gostava de sombra
E água fresca
Meu Deus!
Quanto tempo eu passei
Sem saber!
Han!! Han!...
Foi quando meu pai
Me disse:
"Filha, você é a Ovelha Negra
Da família"
Agora é hora de você assumir
Uh! Uh! E sumir!...
Baby Baby
Não adianta chamar
Quando alguém está perdido
Procurando se encontrar
Baby Baby
Não vale a pena esperar
Oh! Não!
Tire isso da cabeça
Ponha o resto no lugar
Ah! Ah! Ah! Ah!
Tchu! Tchu! Tchu! Tchu!
Não!
(Ovelha Negra da Família!)
Tchu! Tchu! Tchu!
Não! Vai sumir!...

terça-feira, 21 de maio de 2013

PARALELAS


Em meados de 1975, sintonizei pela primeira vez em um radio em minha casa, a Super Radio Tupi do Rio de Janeiro, da rede Associadas. Naquele tempo, como já disse em vários textos ouvia muito rádio e sempre tive um espirito bem garimpeiro, até hoje. Nas garimpagens, descobri o programa A Turma da Maré Mansa. Um programa de humor, que esteve no ar na Radio Tupi, entre os anos 70 e 80 do século passado.

Um programa leve que era dividido em esquetes curtos, que depois foram copiados em programas de TV, como Viva o Gordo e Chico City. Nele trabalharam grandes nomes do humor Brasileiro: Chico Anísio, Geraldo Alves, Orlando Drummond, Zezé Macedo, Rogério Cardoso, Brandão Filho, Zé Trindade e muitos outros. O programa era alternado, entre um quadro humorístico e uma música Brasileira. Eram os tempos em que as rádios tocavam muita musica estrangeira.

Foi numa desta noites (o programa ia ao ar das 21 ás 22h), que ouvi pela primeira vez Paralelas de Belchior. A interprete era Vanusa, da qual já conhecia dos cadernos de cifras do Tio Joaquim e dos Programas Populares da TV. A canção foi digamos a primeira do compositor Cearense que tocou em rádios com um relativo sucesso, embora ele não fosse ainda conhecido. Belchior terá sua consagração com Elis Regina.

Vanusa grava Paralelas no disco Amigos Novos e Antigos de 1975, uma de suas primeiras incursões pela chamada MPB, que além de Belchior traz João Bosco e Aldir Blanc e claro seu então marido Antônio Marcos. Com um inicio na Jovem Guarda, penso que Vanusa sempre foi uma injustiçada pela critica que insistiu (e insiste) em rotula-la como comercial demais. Sua obra é linda, com canções importantes, entre elas Manhãs de Setembro, Rotina e Mudanças.

Paralelas em seu conteúdo marca as reflexões de Belchior sobre o ser humano e seu cotidiano. Ela é uma critica ao cidadão moderno e mediano que se rende ao vil metal e fecha os olhos para os problemas da humanidade. Letra simples e profunda, é quase que uma confissão um arrependimento do personagem que se encantou com as vantagens do Capitalismo e que agora tenta se afastar. A canção também pode ser encontrada no disco Alucinação de 1976 de Belchior, na voz do autor em um arranjo de balada para dançar. Por enquanto vejam aqui o vídeo com Vanusa:

Paralelas

Dentro do carro
Sobre o trevo
A cem por hora, ó meu amor
Só tens agora os carinhos do motor
E no escritório em que eu trabalho
e fico rico, quanto mais eu multiplico
Diminui o meu amor
Em cada luz de mercúrio
vejo a luz do teu olhar
Passas praças, viadutos
Nem te lembras de voltar, de voltar, de voltar
No Corcovado, quem abre os braços sou eu
Copacabana, esta semana, o mar sou eu
Como é perversa a juventude do meu coração
Que só entende o que é cruel, o que é paixão
E as paralelas dos pneus n'água das ruas
São duas estradas nuas
Em que foges do que é teu
No apartamento, oitavo andar
Abro a vidraça e grito, grito quando o carro passa
Teu infinito sou eu, sou eu, sou eu, sou eu

domingo, 19 de maio de 2013

COMO NOSSOS PAIS


Esta canção ouvia muito nas rádios AM inclusive por volta de 1976. Elis Regina já fazia parte de meu imaginário, pré adolescente. Já a conhecia, pela Revista Intervalo, descoberta na casa de minha avó. Não sabia que a música que fazia sucesso, era de um compositor Cearense, lançado por Elis no disco Falso Brilhante. A cantora desde seu primeiro trabalho, tinha a grata mania de lançar novos compositores. Só para citar alguns: Edu Lobo, Ivan Lins, João Bosco e Aldir Blan, Claudio Nucci e muitos outros.

Belchior já tinha lançado um disco, com relativa repercussão, mais em Fortaleza de que no Sul/Sudeste Maravilha. Figura o bigodão como parceiro de Fagner, em canções como Mucuripe, A Palo Seco. Frequentador de Festivais daqueles anos 70, venceu com Na Hora do Almoço no IV Festival Universitário da Canção no Rio de Janeiro.

Mas é Elis Regina quem vai coroar Belchior como um dos mais importantes nomes da música naqueles anos setentistas. O Show Falso Brilhante de temporada recorde em um só local (Dois anos e meio no Teatro Bandeirantes), é que revelaria para o mundo sua obra. Tanto no disco, como no Show, há duas canções de Belchior, esta e Velha Roupa Colorida. As duas serão gravadas no LP Alucinação, o segundo do cantor e compositor Cearense.

Como Nossos Pais, é uma leitura daqueles tempos difíceis de Ditadura Militar e de perspectivas para a Juventude. Belchior é o compositor que mais traduz o cotidiano e o sentimento do Latino Americano. O refrão muito forte, delineia o que frequentemente ouvimos na fase adulta, muita gente dizer “Eu quando Jovem também queria mudar o mundo”. Se dar bem, cuidar da vida, sendo atraído pelo vil metal, pressupõe uma dicotomia de abandonar os sonhos as utopias.

A letra é uma critica a cooptação de antigos ídolos que se renderam ao sistema. Uma critica ao comodismo e ao fechar de olhos para as angustias do mundo coletivo. Belchior passeia por uma analise de consciência de sua própria geração, esmagada pelas botas dos Generais. É uma critica ao conformismo. Muito atual, a música um Blues Rock no arranjo do Cesar Camargo Mariano para a Elis, é uma Balada Blues na voz do compositor, nos faz refletir sobre o conformismo de muitos em relação ao mundo do século XXI.

Tanto o Disco Falso Brilhante da Elis Regina, como o Alucinação de Belchior, são de 1976. Eu cheguei a ter os dois em vinil, são imperdíveis. A mais recente regravação da canção, esta no ótimo disco da filha da Elis, Maria Rita, o CD “Redescobrir”, com faixas de músicas cantadas e consagradas pela maior cantora do Brasil.

Aqui deixo o link para o vídeo da música http://migre.me/eCobS  e a letra abaixo.


Como Nossos Pais

Não quero lhe falar, 
Meu grande amor, 
Das coisas que aprendi 
Nos discos...

Quero lhe contar como eu vivi 
E tudo o que aconteceu comigo 
Viver é melhor que sonhar 
Eu sei que o amor 
É uma coisa boa 
Mas também sei 
Que qualquer canto 
É menor do que a vida 
De qualquer pessoa...

Por isso cuidado meu bem 
Há perigo na esquina 
Eles venceram e o sinal 
Está fechado prá nós 
Que somos jovens...

Para abraçar seu irmão 
E beijar sua menina na rua 
É que se fez o seu braço, 
O seu lábio e a sua voz...

Você me pergunta 
Pela minha paixão 
Digo que estou encantada 
Como uma nova invenção 
Eu vou ficar nesta cidade 
Não vou voltar pro sertão 
Pois vejo vir vindo no vento 
Cheiro de nova estação 
Eu sei de tudo na ferida viva 
Do meu coração...

Já faz tempo 
Eu vi você na rua 
Cabelo ao vento 
Gente jovem reunida 
Na parede da memória 
Essa lembrança 
É o quadro que dói mais...

Minha dor é perceber 
Que apesar de termos 
Feito tudo o que fizemos 
Ainda somos os mesmos 
E vivemos 
Ainda somos os mesmos 
E vivemos 
Como os nossos pais...

Nossos ídolos 
Ainda são os mesmos 
E as aparências 
Não enganam não 
Você diz que depois deles 
Não apareceu mais ninguém 
Você pode até dizer 
Que eu tô por fora 
Ou então 
Que eu tô inventando...

Mas é você 
Que ama o passado 
E que não vê 
É você 
Que ama o passado 
E que não vê 
Que o novo sempre vem...

Hoje eu sei 
Que quem me deu a idéia 
De uma nova consciência 
E juventude 
Tá em casa 
Guardado por Deus 
Contando vil metal...

Minha dor é perceber 
Que apesar de termos 
Feito tudo, tudo, 
Tudo o que fizemos 
Nós ainda somos 
Os mesmos e vivemos 
Ainda somos 
Os mesmos e vivemos 
Ainda somos 
Os mesmos e vivemos 
Como os nossos pais...