domingo, 19 de janeiro de 2014

ALÔ, ALÔ MARCIANO

A Sabedoria Popular, vinda do universo dos pobres, nos traz expressões e frases hilariantes e engraçadas. Esta sabedoria, pautada na História muitas vezes oral do povo, baseado em sua condição social e do ambiente em vive nos faz refletir sobre várias questões entre elas, a das classes sociais. Quem já não ouviu frases do tipo “ O ultimo será o primeiro”, “O Apressado come Cru”, “Cão que muita late, não morde”, e muitas outras frases que ilustram uma situação vivida ou um pensamento.

Após as manifestações de Junho, onde milhares de pessoas foram as ruas protestar, ficou claro os grupos que ali estavam, e os interesses de cada um. Na primeira parte dos protestos, os pobres e as organizações populares, levantavam bandeiras de qualidade de vida e mais politicas públicas. O personagem destas manifestações, eram operários, donas de casa, estudantes pobres, negros e amarelos. Já a segunda parte, altamente estimulada pelas mídias trazia outros personagens e outras bandeiras. Neste ínterim, as palavras de ordem eram o apartidarismo, o ódio aos diferentes e a violência justificando a violência. O personagem de classe média alta, com seus Ipods e Tablet, chegando na Avenida Paulista, com seus carros importados.

Destas manifestações saiu a definição de Coxinhas, para o segundo grupo. Aquele cara que nunca se preocupa com o que acontece aos seu redor, desde que não mexa com seu status e bolso é claro. Aquele que justifica sua condição social, a chamada teoria da seleção Natural, a mesma que criou o Nazismo. A falta de compromisso dos Coxinhas, já foi assunto de teses, textos e música. Uma canção que define bem os Jovens de Classe Média, que tem um discurso superficial e que reproduz discursos da mídia, é a de Max Gonzaga. Clic aqui e ouça: http://zip.net/bkl7WK .

Mas Rita Lee e Roberto de Carvalho, já tratavam do assunto quatro décadas atrás. Alô, Alô Marciano, estourou nas paradas de sucesso em 1980, na interpretação de Elis Regina, tratava o tema como muito humor e ironia. A high society, era como os autores definiam a Classe Média do discurso decorado e conveniente a sua condição social e ao mesmo tempo alienada com o que se passava no País naquele período. High Society tradução que quer dizer Alta Sociedade ou Alta Roda, nada mais era do que a gíria popular daqueles tempos duros.

O Regime Militar embora já demonstra-se naquele anos 80, seu esgotamento, ainda fazia estripulia. Rita e Roberto, vão de certa forma cobrar e denunciar dos bem nascidos e vividos, um engajamento e comprometimento desta classe social na luta contra a ditadura. Naquele momento víamos uma grande crise econômica, causando uma das piores Recessões de nossa História e os autores diziam que a Classe que podia ajudar era Down, triste, porque se acomodava ou se beneficiava com a situação.

Alô, Alô Marciano, esta no disco gravado ao vivo Saudades do Brasil o penúltimo e ultimo lançado em vida por Elis Regina. Clic e ouça: http://zip.net/byl4K3 .
Alô, Alô, Marciano (Elis Regina)
Alô, alô, marciano
Aqui quem fala é da Terra
Pra variar estamos em guerra
Você não imagina a loucura
O ser humano ta na maior fissura porque
Tá cada vez mais down o high society
Down, down, down
O high society
Alô, alô, marciano
A crise tá virando zona
Cada um por si todo mundo na lona
E lá se foi a mordomia
Tem muito rei aí pedindo alforria porque
Tá cada vez mais down o high society
Down, down, down
O high society
Alô, alô, marciano
A coisa tá ficando russa
Muita patrulha, muita bagunça
O muro começou a pichar
Tem sempre um aiatolá pra atola Alá
Tá cada vez mais down o high society
Down, down, down
O high society
Alô, alô, marciano
Aqui quem fala é da Terra
Pra variar estamos em guerra
Você não imagina a loucura
O ser humano ta na maior fissura porque
Tá cada vez mais down o high society
Down, down, down
O high society



sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

CAÇADOR DE MIM

Em 1981, vivia um de meus infernos astrais. A vida é feita deles. Quem não termina o ano, o mês ou o dia, não se achando, aborrecido e ao mesmo tempo em busca de saídas. Estava desempregado, não tinha grana nem pro rolezinho. Estava com dezenove anos, e prestava o serviço militar obrigatório. Foi dureza, fazer seis de tiro de guerra. Não via e não vejo nenhuma razão para se obrigar um jovem ao alistamento militar. Quem decide pela carreira, ainda tem sentido.

Vivia momentos afirmação de personalidade. Sofria de Amor constantemente. Mas a barra estava pesada. Ficar sem emprego, é não conseguir vislumbrar futuro algum. Minha vida limitava-se a turma do Bairro, na mesma situação que a minha. Isto trazia um certo conforto. Quando se é Jovem, é comum milhares de questionamentos existenciais. Me debatia com eles, sofria toda a vez que não encontrava as respostas. A música como já revelei aqui, era o elixir, capaz de me acalmar e ir buscando alternativas reais para o inferno astral.

Ao ouvir Caçador de Mim, do Luís Carlos Sá, parceiro do Guarabira, com o músico Sergio Magrão, em uma destas noites de insônia, ouvi a letra e cantei a melodia. Um exercício que aprendi, desde aqueles tempos. É quando você não cantarola, deixa a letra penetrar nos ouvidos e atingir o coração. Quando seu corpo reage aquelas palavras e aquela melodia que você sussurra para ti mesmo. Sai daquela experiência querendo ouvir outras canções e outros discos da mesma forma.

Sempre gostei de Milton Nascimento, como compositor e como interprete. Milton escreve o interior humano, com tinturas de realidade. E mesmo quando a canção não é escrita por ele, é como se o poema fosse escrito pelo cara. Ouvi de um dos últimos discos do Bituca E a gente Sonhando. Neste discão Milton volta as origens dos tempos de sua cidade Natal Três pontas. E também faz a sua versão de o Sol do Jota Guest. Querem saber melhor que o original. Ouçam aqui: http://zip.net/bql7Lf .

Caçador de Mim, traz as duvidas de um personagem. Sua incessante incomodacão com o fato de tentar seu espaço na vida. A constante busca por uma identidade. Um ser humano que aceita a dialética da vida, que sabe que terá amores e os perderá. Um ser que admite ser manso e também ser feroz. Mas que não teme a luta, embora tenha medo. Um ser que acredita nos sonhos e no viver a sonhar.

Vejo que somos constantemente caçadores de nós mesmos. Todos querem ser felizes, não há uma forma ou modelo para ser feliz. Por isto corremos atrás, somos seres em mutação. O ser humano é capaz de romper lógicas, formulas prontas, porque é um ser criativo e por isto sempre em transformação.

O disco de 1981, fez grande sucesso, inclusive esta obra prima. Clic e ouça: http://zip.net/bql7Lm .

Caçador de Mim
Por tanto amor
Por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz
Manso ou feroz
Eu caçador de mim
Preso a canções
Entregue a paixões
Que nunca tiveram fim
Vou me encontrar
Longe do meu lugar
Eu, caçador de mim
Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito a força, numa procura
Fugir as armadilhas da mata escura
Longe se vai
Sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir
O que me faz sentir
Eu, caçador de mim


quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

ESPANHOLA

Em 2009, músicos do Estado de São Paulo, começaram um movimento, questionando a funcionalidade da OMB- Ordem dos Músicos do Brasil- . Na verdade a grita geral entre os artistas, consistia no fato de vários locais que contratam Shows, principalmente poderes públicos exigiam que o musico, tivesse a carteira de “sócio” da Ordem. Sem este documento, não se apresentava em vários lugares.

Tal fato foi considerado uma tremenda injustiça com a classe. A OMB foi criada pelo Regime Militar. Sua função era na prática, não há defesa da categoria, mas uma espécie de censura prévia aos artistas, principalmente os de oposição á ditadura. O órgão, funcionou como delator daqueles que protestavam contra a repressão. Há registros de várias colaborações de dirigentes da OMB na época com os militares.

Com a redemocratização, a Ordem dos Músicos do Brasil, continuou tendo um papel distante das reivindicações e necessidades dos músicos. Se transformou em um organismo de ditar através da carteirinha, quem trabalha ou não no Brasil. Seu papel de fiscalizador das condições de trabalho e salário que por sinal precárias para a maioria dos músicos, principalmente quem toca na noite, não existe.

O movimento em 2009, ganhou muita força ao ponto de uma liminar expedida pela Justiça tirou em todo o estado de São Paulo a obrigatoriedade dos músicos em estar associados a OMB para poder trabalhar. Foi o Deputado Estadual Carlos Giannasi do PSOL, que entrou com ação solicitando a derrubada da exigência da Carteirinha. Neste mesmo ano, Giannasi esteve em Limeira em um evento cultural, falando desta luta vitoriosa. Por conta dela hoje em São Paulo, esta obrigação não mais existe.

Porem a situação da maioria esmagadora de quem vive de música no País é sofrível. Milhares tocam em bares, restaurantes, lanchonetes, que pagam mal, que mal dá para se sustentar. Ou tentam financiamento público para gravar seu trabalho, quase sempre não conseguem. Mas costumo dizer, que é nesta labuta de não ser pop star, que encontramos grandes talentos.

Espanhola é uma canção de Flavio Venturini e Gutemberg Guarabira, que me faz lembrar dos que vivem da noite. Nos anos 80 peregrinei por bares e boates da cidade que tinham música ao vivo. Esta linda canção de Amor, era sempre tocada e pedida. Flávio Venturini, mineiro, um dos integrantes do Clube da Esquina, sabe o que é tocar nos bailes da vida. Do Terço, passando pelo 14 Bis, e depois na carreira solo, o cantor compositor mostra em seu repertório o que se executa na lida dos músicos.

Espanhola esta no disco Nascente de 1981. O primeiro disco solo do compositor. Clic aqui e ouça esta pérola: http://zip.net/bjl51F .

Espanhola
Por tantas vezes
Eu andei mentindo
Só por não poder
Te ver chorando
Te amo espanhola
Te amo espanhola
Se for chorar
Te amo
Sempre assim
Cai a o dia e é assim
Cai a noite e é assim
Essa lua sobre mim
Essa fruta sobre o meu paladar
Nunca mais
Quero ver você me olhar
Sem me entender em mim
Eu preciso lhe falar
Eu Preciso tenho que lhe contar


terça-feira, 14 de janeiro de 2014

SOBRADINHO

O Baiano Gutemberg Guarabira, talvez não imagina-se que sua valsa rancho vitoriosa no II Festival Internacional da Canção de 1967, da Rede Globo, fosse pelo menos lhe abrir caminhos para uma carreira de sucesso. Margarida nem era favorita naquele Festival, que tinha Chico Buarque e sua Carolina e Milton Nascimento e a extraordinária Travessia. Guarabira, deixa os favoritos para trás, e com a interpretação do Grupo Vocal Manifesto, arrebata o galo de ouro, símbolo daquele certame. Margarida não emplacou nas paradas de sucesso. Poucos se lembram dela. O próprio autor não há canta mais em seus shows. Mas o lançou para o País. Clic aqui e ouça Margarida: http://zip.net/bgl5GC .

O Carioca Luís Carlos Sá, naqueles anos 60, trilhou primeiro uma carreira apenas como compositor, depois foi fazer o circuito dos Festivais e tentar consolidar uma carreira solo. Unindo a Bossa Nova e ligado ao que os mineiros faziam, mais influências do Rock Inglês e de do Folk Americano, principalmente Bob Dylan, foram construindo em Sá uma concepção musical. Mas antes teve em Giramundo seu primeiro sucesso, gravado por Pery Ribeiro. Clic e ouça a canção: http://zip.net/byl5Zr .

E aí no final dos 60, o encontro com Guarabira e Zé Rodrix. O ultimo mineiro, vinha da experiência do Rock Progressivo e Psicodélico do Grupo de Belo Horizonte Som Imaginário. Uma banda que começou como acompanhante de Milton Nascimento e que teve como integrantes, feras, como Wagner Tiso, Tavito, Beto Guedes e outros. A união do Carioca, do Baiano e do Mineiro, criou um ritmo original o Rock Rural. As tradições do Nordeste, o Folk Americano e a batida da Bossa Nova, com o ritmo Mineiro e Progressivo, deu ao mundo o trio Sá, Rodrix e Guarabira. Gravaram dois discos de muito sucesso, mas com a saída de Zé, surgia Sá & Guarabira. Clic e ouça Primeira Canção da Estrada. http://zip.net/bkl5By .

Sobradinho cidade Baiana ao Norte do Estado, foi criada no lugar de Remanso, Casa Nova, Sento Sé e Pilão Arcado. As águas da Barragem que sustenta a Hidrelétrica de Sobradinho, expulsou de suas terras e casas mais de 70 mil pessoas. Até hoje nenhuma delas foi indenizada pelo Estado Brasileiro. A Ditadura Militar em 1977, começa a construir mais um de seus projetos faraônicos e milionários.

Me lembro que a Diocese de Juazeiro da Bahia, organizou uma campanha no Brasil todo de solidariedade as vitimas da Usina e da Barragem. O companheiro Wilson Zanetti meu amigo, esteve lá em 1979, empunhando solidariedade aquele povo, que já sofria com a seca medonha e via toda uma vida sendo soterrada pelas águas.

Em 1977, Sá e Guarabira lançam que para mim é o melhor disco da dupla. Pirão de Peixe com Pimenta, abre com Sobradinho, canção denuncia daquela atrocidade dos Militares. O refrão tirado de Antônio Conselheiro é fantástico. Ouçam a canção: http://zip.net/bsl5Ln .

Sobradinho
O homem chega, já desfaz a natureza
Tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar
O São Francisco lá pra cima da Bahia
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar
E passo a passo vai cumprindo a profecia do beato que dizia que o Sertão ia alagar
O sertão vai virar mar, dá no coração
O medo que algum dia o mar também vire sertão
Adeus Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Adeus Pilão Arcado vem o rio te engolir
Debaixo d'água lá se vai a vida inteira
Por cima da cachoeira o gaiola vai, vai subir
Vai ter barragem no salto do Sobradinho
E o povo vai-se embora com medo de se afogar.
Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Pilão Arcado, Sobradinho
Adeus, Adeus ...






domingo, 12 de janeiro de 2014

DONA

O Paulista Dias Gomes, não é a toa que nasceu em um ano mágico para as artes e a politica no Brasil. Primeiro, pois foi em 1922, que aconteceu a Semana de Arte Moderna, que viria mudar radicalmente, o que se fazia de cultura até então no País. O caráter erudito e elitista, dá lugar ao engajamento social e a ousadia no fazer arte. Os Modernistas irão ser uma das influências de Dias. É neste ano de 22, que uma outra referencia será importante na vida, na obra e na carreira do escritor. A fundação do PCB, o Partido Comunista Brasileiro, no qual na fase adulta Dias Gomes era militar e buscar fontes para seu trabalho.

Dias, se notabilizou primeiro no Rádio, escrevendo as famosas radio novelas, pre História das Telenovelas. Foi no dial radiofônico que Dias Gomes, adaptou mais de 50 peças suas para teatro. Entre elas a internacionalmente conhecida O Pagador de Promessas. Será com este texto adaptado e dirigido por Anselmo Duarte, que irá em 1961, a ganhar a Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes. Mas a Ditadura Militar se implanta no Brasil. Com ela Dias Gomes será um dos autores mais cassados e censurados pelos Militares.

O Berço do Herói escrita em 1965, foi proibida no dia de sua estreia. A peça tinha um roteiro, que contava a História de Jorge, soldado da FEB, na segunda Guerra Mundial, que após uma batalha na Itália, desaparece, e nunca mais é encontrado. De repente, o protagonista, se transforma em Herói ao supostamente morrer. Sua cidade Natal, o elege a Santo, provocando romarias imensas a procura de milagres, do tal soldado. Dias Gomes faz uma critica aos falsos mitos, de situações e personagens reais. No caso em voga a Ditadura Militar, que justificava o golpe na ameaça Comunista.

Vai ser o Berço do Herói, a base para o autor, escrever Roque Santeiro, em 1975. Tudo foi montado para a estreia da Novela. As vésperas de entrar no ar, a produção, foi censurada na integra. 30 capítulos tinham sido já gravados. A justificativa da Censura dos Militares, teria sido um grampo no telefone do autor, onde o mesmo teria dito, que Roque Santeiro, era na verdade o Berço do Herói, com algumas adaptações, para ludibriar a censura. Este fato, causou enormes transtornos a rede Globo, que teve que colocar Selva de Pedra, um remake até a produção de Pecado Capital de Janete Clair, mulher de Dias Gomes.

Dez anos depois já na Redemocratização, Roque Santeiro, foi liberada e Aguinaldo Silva, readaptou o texto de 75. Vários personagens, foram mantidos com atores do original. Mas foi Regina Duarte, na pele da Viúva de Roque, Porcina e seu caso com o Coronel Sinhozinho Malta que rouba a cena da Novela. Sucesso absoluto.

Dona de Sá e Guarabira, em uma trilha Sonora de primeira, será uma dos maiores sucessos. Tema de Porcina, a canção teve várias interpretações. Ouça aqui com a maior delas, Roupa Nova: http://zip.net/btl4p0 .
Dona
Dona
Desses traiçoeiros
Sonhos
Sempre verdadeiros
Oh, Dona
Desses animais
Dona
Dos teus ideais
Pelas ruas onde andas, onde mandas todos nós
Somos sempre mensageiros esperando a tua voz
Teu desejo uma ordem, nada é nunca, nunca é não
Por que tens dessa certeza dentro do teu coração
Tam, tam, tam, batem na porta, não precisa ver quem é
Pra sentir a impaciência do teu pulso de mulher
Um olhar me atira à cama, um beijo me faz amar
Não levanto, não me escondo porque sei que és minha dona
Dona
Desses traiçoeiros
Sonhos
Sempre verdadeiros
Oh, Dona
Desses animais
Dona
Dos teus ideais
Não há pedra em teu caminho, não há onda no teu mar
Não há vento ou tempestade que te impeçam de voar
Entre a cobra e o passarinho, entre a pomba e o gavião
Ou teu ódio ou teu carinho nos carregam pela mão
É a moça da cantiga, a mulher da criação
Umas vezes nossa amiga, outras nossa perdição
O poder que nos levanta, a força que nos faz cair
Qual de nós ainda não sabe que isso tudo te faz dona...


sábado, 11 de janeiro de 2014

CADÊ VOCÊ

A Editora Guemanise do Rio de Janeiro, é especializada em editar e publicar livros de contos, poesias e crônicas. Conheci o trabalho da editora, pelo portal de poesias Releituras. Vi que a mesma, organizava vários concursos literários. Comecei a participar deles em 2006. Nunca consegui uma boa colocação, para como prêmio ter meu trabalho divulgado.

Em 2007 a Guemanise, criou o Concurso “Cantigários”. Consistia em contos, crônicas e poemas, versados sobre o tema MPB. Era a Música Brasileira, que estaria em foco, nos textos. Decidi escrever alguma coisa sobre este assunto, do qual dedico parte considerável da minha vida, estudando-o. Pensei em versos poéticos, ou em crônica. Mas percebi que seria mais um na multidão. Muitos escritores, como constatei posteriori, usariam este caminho.

Matutei com os botões de minha blusa e decidi escrever um conto. O tema inicial seria os Festivais de Música. Mas achei temário batido. Ao passar por uma das avenidas de meu bairro, ouvi Cadê Você de Odair José, tocando em um bar. Ao mesmo tempo, tinha lido sobre os Panteras Negras e um gesto feito por eles como saudação e símbolo do movimento. Braços levantados e punhos cerrados. No livro Enquanto corria a barca, sobre a Contracultura e as Artes nos anos 70, há uma passagem, que diz que Erasmo Carlos, usava este gesto, ao se apresentar no palco. Um dia durante uma apresentação no programa Silvio Santos, terminou de cantar e cerrou os punhos. Um agente da Censura, lá estava. Erasmo ficou horas se explicando no DOPS.

Estava fechado a estrutura do texto. Contaria a História da MPB, tendo como inicio a canção de Odair José e o símbolo dos Panteras, como fechamento. Falaria da Ditadura é claro. Pensei em um personagem próximo a mim e os de minha geração. Pobre, musico e sonhador. O titulo “Cadê Você: ou como escrevi este conto”. A história de um garoto que resolve se inscrever no programa de calouros de Silvio Santos na década de 70. Narro o dia da apresentação, o convívio com os amigos, o Amor, enfim como e porque ele escreveu este conto.

Fui premiado no concurso com uma menção honrosa e tive meu conto publicado na Coletânea com os demais textos. Sempre gostei de Odair José. Primeiro pelo fato de ouvi-lo muito em minha pre e adolescência nas rádios. Segundo, pelo fato de um cara que tem coragem de abordar temas até então proibidos naqueles tempos, como a pílula, ou a prostituição, não pode ser considerado um artista menor. Caetano Veloso é o primeiro a reconhecer isto, quando em um Show da antiga gravadora Philips, não só cantou Odair José como cantou com ele.

Cadê você o conto quem quiser, pode deixar o pedido aqui nos comentários ou no Facebook. Cadê Você esta canção Romântica, que esta no LP de 1973, o quarto na carreira do cantor, você ouve aqui:  http://zip.net/bpl4h4 .

Cadê você?
O tempo vai
O tempo vem
A vida passa
E eu sem ninguém
Cadê você?
Que nunca mais apareceu aqui
Que não voltou pra me fazer sorrir
Que nem ligou
Cadê você?
Que nunca mais apareceu aqui
Que não voltou pra me fazer sorrir
Então, cadê você?
Mas não faz mal
Pois eu me calo
Tá tudo bem
Eu sempre falo
Cadê você?
Que nunca mais apareceu aqui
Que não voltou pra me fazer sorrir
Que nem ligou
Cadê você?


quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

DOMINGO FELIZ

Em 2012, a Câmara Municipal de Limeira homenageou com Titulo de Cidadão, o empresário artístico Geraldo Alves. Geraldo vive na cidade a muitos anos. Ficou conhecido nacionalmente, por ter sido empresário de Roberto Carlos em inicio de carreira. Naquele tempo a profissão (hoje intitula-se agente), não tinha a valorização dos dias atuais. Pensar em uma pessoa que cuide da carreira do artista, agende Shows, negocie contratos e outras tarefas, era muito raro, nos anos 60. Como um dos pioneiros Geraldo Alves, abriu um campo imenso para consolidar nomes como Marcos Lazaro e Guilherme Araújo, o primeiro empresário de Elis Regina e o segundo foi de Gilberto Gil e Caetano por muitos anos.

Na solenidade de entrega da honraria ao Empresário, estava uma figura ilustre. Desconhecido pelas novas gerações, mas extremamente popular, entre os da minha geração. Ângelo Máximo, estava no plenário prestigiando com sua presença o amigo e ex. empresário. Além de discursar o cantor, deu duas palhinhas cantando sucessos seus dos anos 70. Clic aqui e ouça A Primeira Namorada: http://zip.net/bgl28C .

Quem lá estava, conta que Ângelo mantem o mesmo porte físico e aparência dos anos de ouro de sua carreira, embora os cabelos brancos e uma pequena barriga, denuncie o passar dos anos. Ângelo Máximo, era considerado um artista popular. Vendia muito, tinha aparições constantes na TV e suas músicas tocavam absurdamente nas rádios. Rotulado como cantor Brega Romântico, era comparado a Wanderlei Cardoso, principalmente no timbre de voz.

Foi revelado, pelo programa de Calouros de Silvio Santos. A vitrine para artistas naquele tempo, era sem dúvida estes concursos musicais. Muitas vezes dava-se a impressão de ser marmelada ou de cair no ridículo, pois o humor popularesco, escondia muitas vezes o talento. Me divertia muito com estes programas, geralmente aos sábados á tarde, como clube do bolinha, Raul Gil. Mas o de Silvio Santos, sempre aos Domingos, era especial. Ângelo Máximo surge para o grande público neste formato.

Gravou três LPs nos anos 70. O primeiro em 1975, onde se destacam  "Minhas férias sem você", de Tony Damito, "Venha comigo amanhecer", de Lucinha, "Quando o dia nascer", de Laerte Freire e Valentino Guzzo, além de composições próprias como "Vem me fazer feliz". Em 1977, o segundo LP pela gravadora Bervely onde o destaque é Domingo Feliz. O terceiro, já em 1978, já apontava um declínio na carreira. Voltaria a gravar, depois de um hiato de 22 anos, em 2000 enveredando para a música sertaneja.

Domingo Feliz, foi cantada e recantada, pelos quatro cantos do País. Foi sem dúvida o maior sucesso de Ângelo Máximo. O personagem que prenuncia que os Domingos vão ser felizes, porque estará com o seu amor. Letra simples ritmo alegre, sucesso rápido. Click e ouça: http://zip.net/bxl3MH .

Domingo Feliz
Meu domingo
Alegre vai ser
Pois pretendo sair com você
Ye ye ye que dia feliz
De mãos dadas vamos andar
Muitos beijos iremos trocar
Ye ye ye que dia feliz
Ha ha ha hoje é meu dia
Eu vou ter ter ter o seu amor
Para ser ser ser feliz ao seu lado
Uol ha ha ha que dia feliz

Tudo aquilo
Que eu quero vou ter
Só você
Vai me compreender
Ye ye ye que dia feliz

Nosso sonho
De amor vai durar
Pois pra sempre
Eu vou lhe adorar
Ye ye ye que dia feliz

Ha ha ha hoje é meu dia
Eu vou ter ter ter o seu amor
Para ser ser ser feliz ao seu lado
Uol ha ha ha que dia feliz (3x)


quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

PRO DIA NASCER FELIZ

Faço uma comparação da Banda Barão Vermelho dos tempos de Cazuza, com o The Doors de Jim Morrison. Não nos arranjos, pois se o primeiro puxa para o Rock Blues, o segundo alia a formação clássica de Ray Manzarek com o em inicio Rock Progressivo e Psicodélico. Mas o fato das duas bandas terem dois poetas, Cazuza e Morrison, personalidades rebeldes, expansivas e libertarias. O fato também de Roberto Frejat e Ray Manzarek, significarem o equilíbrio que os poetas não tinham, o profissionalismo que lhes faltavam.

Mas a poesia dos poetas e a genialidade musical dos equilibristas, dava samba ou melhor resultava em o melhor do Rock In Rool em seus tempos. As letras de Morrison eram realistas, como eram as de Cazuza. Embora Jim, viajava pela solidão e depressão de uma Juventude que não queria seguir os passos de seus pais. Cazuza abordava a geração nascida e crescida na Ditadura Militar. Falava de uma rebeldia mais otimista, que tira-se os jovens do clima baixo astral dos militares. Embora Frejat é mais Stones, mas a semelhança com os Doors não é pequena. Ouça aqui Light May Fire: http://brzu.net/04xsf

O nome Barão Vermelho, vem de um aviador Alemão  Manfred von Richthofen, principal inimigo dos aliados na Primeira Guerra. Ironia escolher o apelido de um militar que vinha da nação, ainda não Nazista, mas já se preparando para o ser. Outra ironia, é que a ideia de montar uma banda nasceu depois que dois integrantes do futuro Barão assistiram o Show do Queen em São Paulo. Cazuza vai ser indicado por Léo Jaime, primeiro vocalista do Barão. Não deu certo com Léo, mas tudo indicava que daria com o Agenor de Miranda.

Cazuza ofereceu não só a voz que se encaixava no estilo da banda. Mas ofertou letras que falavam do cotidiano de uma adolescência e juventude que ele e seus companheiros viviam. Letras aparentemente despretensiosas ou até alienadas. Porem desnudavam o que pensava e praticava aquela Juventude do inicio dos anos 70. O lado MPB clássico de Cazuza, ainda estava adormecido. Prevalecia histórias que se encaixavam nos arranjos Rock de Frejat. Coisa do tipo Bete Balanço, Bilhete Azul e Maior Abandonado, grande Hit após apresentação apoteótica no Rock In Rio I. Ouça Maior Abandonado aqui: http://brzu.net/04xsg .

E vai ser o maior Festival de Rock feito no Brasil, que fará o Barão Vermelho e Cazuza, entrarem definitivamente nos corações e mentes do povo Brasileiro. Mas não foi tanto pelo Show no evento. E sim pela interpretação de Ney Mato Grosso em sua apresentação de Pro Dia Nascer Feliz. A canção é do segundo trabalho da Banda de 1983. Passou em branco e preto, quase ninguém prestou a atenção. Mas na voz esfuziante de Ney Pro Dia, nasceu realmente Feliz para Cazuza, Frejat e CIA.

Após o evento no Rio, Pro Dia Nascer Feliz estoura nas paradas e o Barão Também. A letra da musica prenuncia o fim de tempos duros para aquela Juventude. Clic e ouça:  http://brzu.net/04xsh .

Pro dia Nascer Feliz
Todo dia a insônia
Me convence que o céu
Faz tudo ficar infinito
E que a solidão
É pretensão de quem fica
Escondido fazendo fita...
Todo dia tem a hora
Da sessão coruja
Só entende quem namora
Agora vão'bora...
Estamos bem por um triz
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir, dormir
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir...
Todo dia é dia
E tudo em nome do amor
Ah! Essa é a vida que eu quis
Procurando vaga
Uma hora aqui, a outra ali
No vai e vem dos teus quadris...
Nadando contra a corrente
Só pra exercitar
Todo o músculo que sente
Me dê de presente o teu bis
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir, dormir
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir...
Todo dia é dia
E tudo em nome do amor
Ah! Essa é a vida que eu quis
Procurando vaga
Uma hora aqui, a outra ali
No vai e vem dos teus quadris...
Nadando contra a corrente
Só pra exercitar
Todo o músculo que sente
Me dê de presente o teu bis
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir, dormir
Pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
O mundo inteiro acordar
E a gente dormir...
Oh oh oh oh
Oh oh oh oh
Oh oh oh oh...


terça-feira, 7 de janeiro de 2014

EDUARDO E MÔNICA

Existe um dito popular, que afirma que os opostos se atraem. Que as diferenças de personalidade, comportamento e intelecto, são fundamentais, para uma relação amorosa ser saudável e duradoura. As vezes acredito nesta tese. Vejo por mim. Minha mulher e eu vivemos juntos há 23 anos. Somos diferentes em muita coisa. Quando nos conhecemos, achávamos que estas diferenças atrapalhariam um relacionamento mais duradouro. O tempo provou que onde há amor, não há diversidade capaz de complicar uma relação.

Renato Russo, escrevia sobre sua geração (minha também). Uma geração que ele mesmo chamava de filhos da Revolução (Golpe) de 1964. Uma juventude que nasceu e cresceu sob o signo do medo, do terror. Tudo era proibido, inclusive expressar diferenças. Ser diferente naquele tempo, era pedir para ir pra cadeia. Um abismo entre ricos e pobres, se criou não só no aspecto econômico social, mas cultural. Quem imaginaria um garoto de periferia de caso com uma garota Classe Média?.

Mas a ditadura foi perdendo a força. O povo começou reaprender a botar para fora, suas diferenças. Como sempre a musica foi e ainda é o caminho, para traduzir o que se pensa, o que se faz. A distancia entre o menino do subúrbio, com a menina dos Jardins, começa a encurtar na vida e na música. O diferente provoca seu oponente, com suas preferencias artísticas, culinárias, da moda enfim, a reciproca também é verdadeira.

No filmaço Todos Somos Jovens, que conta a vida de Renato Russo até a formação da Banda Legião Urbana, tem detalhes fantásticos na forma de criar do poeta. Renato como todo Jovem tem sua turma. Ela é os filhos dos políticos e funcionários públicos de Brasília. Este era o seu mundo, seu universo. Dele o líder da Legião buscou conteúdo para sua obra.

Um determinado momento, Renato Russo, compra um gravador e o coloca escondido todas as vezes, que esta em conversas com seus amigos. Em uma delas Dinho Ouro Preto do Aborto Elétrico e depois do Capital Inicial, vai comunicar a Renato que irá se casar com sua namorada. Os dois são completamente diferentes. Dinho o Playboy descompromissado com as coisas do mundo, ela compenetrada na literatura de primeiro nível. Nasce Eduardo e Mônica.

Uma das canções mais emblemáticas do repertório da Legião Urbana. Lançado no disco 2, foi a faixa que mais tocou nas rádios em 1986. Um Blues todo ritmado pelo violão, Eduardo e Mônica, faz casais refletirem e darem gargalhadas juntos pela semelhança de muitos com a letra da canção. Nos Shows da Banda, era a mais cantada e pedida pelo público.

No dia 07 de Junho de 2011, Eduardo e Mônica completaram 25 anos, em que foram criados por Renato Russo. A Operadora Vivo, para comemorar este aniversário e homenagear os Namorados, no dia deles, fez um clipe moderno e mercadológico da música. Vivemos as Diferenças. Ouça esta Versão: http://brzu.net/04xpi .

Eduardo e Mônica
Quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer
Que não existe razão?
Eduardo abriu os olhos, mas não quis se levantar
Ficou deitado e viu que horas eram
Enquanto Mônica tomava um conhaque
No outro canto da cidade, como eles disseram
Eduardo e Mônica um dia se encontraram sem querer
E conversaram muito mesmo pra tentar se conhecer
Um carinha do cursinho do Eduardo que disse
"Tem uma festa legal, e a gente quer se divertir"
Festa estranha, com gente esquisita
"Eu não tô legal, não agüento mais birita"
E a Mônica riu, e quis saber um pouco mais
Sobre o boyzinho que tentava impressionar
E o Eduardo, meio tonto, só pensava em ir pra casa
"É quase duas, eu vou me ferrar"
Eduardo e Mônica trocaram telefone
Depois telefonaram e decidiram se encontrar
O Eduardo sugeriu uma lanchonete
Mas a Mônica queria ver o filme do Godard
Se encontraram, então, no parque da cidade
A Mônica de moto e o Eduardo de camelo
O Eduardo achou estranho e melhor não comentar
Mas a menina tinha tinta no cabelo
Eduardo e Mônica eram nada parecidos
Ela era de Leão e ele tinha dezesseis
Ela fazia Medicina e falava alemão
E ele ainda nas aulinhas de inglês
Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
Van Gogh e dos Mutantes, de Caetano e de Rimbaud
E o Eduardo gostava de novela
E jogava futebol-de-botão com seu avô
Ela falava coisas sobre o Planalto Central
Também magia e meditação
E o Eduardo ainda tava no esquema
Escola, cinema, clube, televisão
E mesmo com tudo diferente, veio mesmo, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia, como tinha de ser
Eduardo e Mônica fizeram natação, fotografia
Teatro, artesanato, e foram viajar
A Mônica explicava pro Eduardo
Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar
Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer
E decidiu trabalhar (não!)
E ela se formou no mesmo mês
Que ele passou no vestibular
E os dois comemoraram juntos
E também brigaram juntos muitas vezes depois
E todo mundo diz que ele completa ela
E vice-versa, que nem feijão com arroz
Construíram uma casa há uns dois anos atrás
Mais ou menos quando os gêmeos vieram
Batalharam grana, seguraram legal
A barra mais pesada que tiveram
Eduardo e Mônica voltaram pra Brasília
E a nossa amizade dá saudade no verão
Só que nessas férias, não vão viajar
Porque o filhinho do Eduardo tá de recuperação
E quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer
Que não existe razão?



segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

NOTURNO

Raimundo Fagner, entrou na minha lista de Favoritos, através do Ex Padre, meu Diretor Espiritual e a amigo, Luís Carlos do Nascimento. Já disse aqui em outras crônicas, minha admiração e amizade pelo exímio violeiro Luís Carlos. Nas inúmeras cantorias que fazíamos no inicio dos anos 80, no salão da hoje Paróquia de Santa Luzia, o Cearense Fagner era sempre lembrado.

Confesso que gostava mais de Raimundo Fagner daquela fase, do que a da metade daquela década. As canções falando do universo Nordestino, resgatando culturas e até denunciando a seca e a fome por ela provocada, me animava mais. Fagner com seus diversos parceiros, entre eles Belchior, Fausto Nilo, Manassés, Ednardo e outros, navegava com letras enigmáticas e ao mesmo tempo filosóficas, pelas entranhas do ser humano.

O primeiro estouro de Fagner, que o vai fazer conhecido, ouvi na antiga radio Andorinhas de Campinas, FM. Revelação, me fez ter contato com aquela voz forte de um sotaque Nordestino potente, que com ela arrebatava nossos ouvidos com seriedade, fazendo o coração pulsar e a mente pensar. As canções de Fagner, daquele período, foram feitas para refletir, pensar em muito. Revelação, fala do Amor, que o compositor tenta guardar, mas ele insiste em incomodar, mesmo em uma separação. Clic e ouça Revelação: http://brzu.net/04xnw .

Durante todo os anos 70, Fagner trilhou os caminhos dos Festivais de música, canal que dava visibilidade aos novos artistas, por conta da Televisão. Foi em um destes Festivais, que a turma do Pasquim descobriu o Raimundo. Um projeto que infelizmente não deu certo, o Disco de Bolso, um compacto simples era encartado junto com o Jornal Alternativo. Trazia de um lado, um artista consagrado, do outro um lançamento. Fagner participa do segundo volume do disco de bolso em 1972 com Mucuripe, parceria dele com Belchior. O consagrado era Caetano Veloso com A Volta da Asa Branca. Mucuripe este poema fantástico, vai ser conhecido no grande público, quando Roberto Carlos em 1975 canta a canção. Ouça Mucuripe: http://brzu.net/04xnx .

Abandonei Raimundo Fagner, após suas incursões por canções mais comerciais menos elaboradas. Não conseguia entender aquela opção em conquistar um público mais popular, que ouvia AM e assistia programas de auditório. Me reconciliei com o compositor, em 1989, quando esteve em Limeira. Foi um Show memorável, no Ginásio de Esportes do Nosso Clube. Sairiam sim a até bonita Borbulhas de Amor, mas o que eu queria mesmo era ouvir, Canteiros, Eternas Ondas, Guerreiro Menino e tantas outras.

Noturno é a canção desta resenha. Uma das ultimas da fase da poesia pura, arranjada com o fado português e a balada Brasileira. O primeiro verso é de arrepiar os cabelos. Uma obra que fala de desilusão, solidão, paixão e ao mesmo tempo de esperança. Os tempos ainda eram bicudos. Noturno esta no LP de 1979 Beleza e foi abertura da novela da Globo, Cavalo Alado. Clic e ouça: http://brzu.net/04xny .

Noturno
O aço dos meus olhos
E o fel das minhas palavras
Acalmaram meu silêncio
Mas deixaram suas marcas...
Se hoje sou deserto
É que eu não sabia
Que as flores com o tempo
Perdem a força
E a ventania
Vem mais forte...
Hoje só acredito
No pulsar das minhas veias
E aquela luz que havia
Em cada ponto de partida
Há muito me deixou
Há muito me deixou...
Ai, Coração alado
Desfolharei meus olhos
Nesse escuro véu
Não acredito mais
No fogo ingênuo, da paixão
São tantas ilusões
Perdidas na lembrança...
Nessa estrada
Só quem pode me seguir
Sou eu!
Sou eu! Sou eu!...
Hoje só acredito
No pulsar das minhas veias
E aquela luz que havia
Em cada ponto de partida
Há muito me deixou
Há muito me deixou...
Ai, Coração alado
Desfolharei meus olhos
Nesse escuro véu
Não acredito mais
No fogo ingênuo, da paixão
São tantas ilusões
Perdidas na lembrança...
Nessa estrada
Só quem pode me seguir
Sou eu!
Sou eu! Sou eu! Sou eu!...
Ai, Coração alado
Desfolharei meus olhos
Nesse escuro véu
Não acredito mais
No fogo ingênuo, da paixão
São tantas ilusões
Perdidas na lembrança...
Nessa estrada
Só quem pode me seguir
Sou eu!
Sou eu! Sou eu! Sou eu!...